sábado, 31 de dezembro de 2016
Actividades Realizadas em 2016
Por ordem cronológica:
26 de Dezembro - Serra do Gerês - Calcorreando de Leonte ao Pé de Cabril
24 de Dezembro - Serras do Porto - Calcorreando das Minas ao D'Ouro
4 de Dezembro - Penafiel - com o G.E.N.O.M.A. na Rota do Românico, Ma Non Troppo
13 de Novembro - Serra do Gerês - Calcorreando no Trilho da Rocalva (c/ Cutelo de Pias)
29 de Outubro - Galiza - com o G.E.N.O.M.A. nos Moinhos d'O Rosal e Monte Aloia
16 de Outubro - Serra do Marão - c/ Amigos do Pedal de Mafomedes à Sra da Serra (1.415m)
1 de Outubro - Serras do Porto - Ensaio às Minas das Banjas
24 de Agosto - Penafiel - Ensaio Final ao Trilho de Lagares "Trilho das (12) Meninas"
4 de Agosto - Penafiel - Caminhada Infantil no Trilho de Figueira (Rural)
3 de Agosto - Penafiel - Caminhada Infantil no Trilho de Figueira (Monte)
10 de Julho - Penafiel - com o G.E.N.O.M.A. na Inauguração do "Trilho das Lendas"
11 de Junho - Maciço Central dos Pirinéus - Ascenção ao Pico do Aneto (3.404m)
10 de Junho - Picos de Urbión - Ascenção do Urbión (2.228m) e Nascente do Rio Douro
6 de Março - Serra do Larouco - Calcorreando de Padornelos ao Larouco (1.535m)
20 de Fevereiro - Penafiel - Calcorreando por Figueira
10 de Fevereiro - Província de Cádiz - Calcorreando por Setenil de las Bodegas
9 de Fevereiro - Serras de Ronda - Calcorreando na Cueva de la Pileta
9 de Fevereiro - Província de Málaga - Calcorreando no Caminito d'El Rey
8 de Fevereiro - Calcorreando pelas praias de Marbella
7 de Fevereiro - Província de Huelva - Calcorreando na Gruta de las Maravillas
23 de Janeiro - Tapada de Mafra - Calcorreando com Lobos
16 de Janeiro - Serra do Gerês - Caminhada Infantil na Pedra Bela
sexta-feira, 22 de abril de 2016
A LENDA DOS GIGANTES
A Lenda dos Gigantes, sua Calçada e seu Cansaço...
(Texto Original / Ilustrações da Internet)
No norte da Irlanda existe um local mágico a que chamam a
Calçada dos Gigantes! É uma espécie de calçada de basalto em que as pedras de
forma hexagonal parecem só terminar no centro da Terra! Ora, segundo a lenda
local, a calçada que ali se encontra são as ruinas duma antiga via que aí fora construída
por um gigante irlandês de seu nome Fionn mac Cumhaill (também conhecido por
Finn) com o intuito de ligar a sua ilha à Escócia, onde iria defrontar um outro
gigante, este escocês e conhecido por Benandonner (Ben), de quem recebera o
desafio para um confronto que determinaria qual dos dois era o mais poderoso!
Assim que chegou à Escócia, Finn logo se apercebeu que
Ben era bem maior que ele e que por isso dificilmente o venceria. O gigante
resolveu então voltar à sua terra sem confrontar o adversário. Contudo o
escocês soubera que o irlandês construíra a calçada e que por isso já poderia
atravessar o mar para o defrontar! Ben decidiu então partir no encalce do seu
adversário com o intuito de o esmagar no seu reduto e demonstrar, desse modo,
todo o seu poderio.
Com a nova estrada, não lhe foi muito difícil chegar até
ele, mas ainda o gigante Ben vinha a caminho e já Oonagh (Oona), a astuta
mulher de Finn, congeminava um plano para livrar o marido dum confronto que
parecia inevitável. Oona vestira o marido de modo a aparentar que se tratava de
um bebé gigante e não de um guerreiro. Depois decorou um enorme caixote como se
se tratasse de um berço e Finn deitou-se lá.
Deste modo, assim que Ben alcançou a casa de Finn, apenas
encontrou a mulher e o suposto filho no berço. Ao ver tamanho bebé, o gigante
ficou logo apreensivo, se o filho era assim então como seria o pai! Oona contou
então que o marido se ausentara mas que estaria quase a chegar e serviu-lhe uns
biscoitos caseiros enormes. O gigante aceitou a oferta sem desconfiar que no seu
interior estava uma argola de ferro. Ao morder o doce, Ben soltou um grito com
a dor do dente a partir. A mulher aproveita então para insultar o gigante
chamando-lhe fraco por não conseguir comer um dos seus biscoitos, que o marido
tanto apreciava, e dando um, sem recheio de ferro, ao camuflado Finn, diz-lhe
que até um bebé os consegue comer! Ao ver tamanho feito, Ben decide abandonar
de vez aquela ilha com medo de tal gigante que tinha um filho daquele tamanho e
se alimentada com doces que lhe partiam os dentes!
No regresso a casa Ben ainda destrói a calçada para que o
outro gigante não o pudesse procurar na sua pátria escocesa!
Para os nossos amigos do norte a história termina aqui,
mas para nós não… é que passados algum tempo chega por fim aos ouvidos de Ben a
notícia de que na verde ilha irlandesa todos o gozavam por ter fugido de um
gigante menos gigante que ele, contando-se as peripécias de como havia sido
enganado pela mulher!
Desta vez não haveria contemplação, Ben estava furioso,
os seus olhos soltavam esgares aniquiladores e a sua respiração libertava um
sopro de destruição. Prometeu não voltar sem destruir Finn e a terra que ele
pisasse!
Como já não existia a passagem construída por Finn entre
as duas ilhas, Ben enche-se de coragem e resolve ir a “Mull of Kintyre”, um
local de grande significado para os escoceses e dar um salto gigante para “Torr
Head” na outra ilha, mesmo porque estes dois locais são os pontos mais próximos
geograficamente entre os dois territórios e daí o local ideal para conseguir
tal feito.
Com este salto toda a ilha irlandesa é abalada pelo peso
do gigante ao aterrar no solo. Finn, prevenido da ameaça que se aproxima e
sabendo que desta vez não conseguiria ludibriar o gigante, decide partir para
terras longínquas para evitar que a sua bem-amada pátria fosse destruída com a
batalha de gigantes que, agora sim, seria inevitável!
A sua intenção agora é a de alcançar as terras do
fim-do-mundo - a Callaicia - nome por que era outrora conhecido o norte da
península ibérica. Para isso, Finn teria de utilizar uma outra passagem, esta
feita com umas barcas flutuantes gigantes, que ele, secretamente, havia
construído para ligar o seu território à Bretanha (actualmente na França) e de
onde poderia alcançar o distante território da Callaicia, no fim-do-mundo
antigo.
Enquanto Finn foge, Ben corre atrás dele deixando um
rasto de destruição à sua passagem, não ficando qualquer barca para contar a história
desta passagem flutuante para gigantes.
O campo de batalha escolhido por Finn para enfrentar o seu
oponente foram as terras actualmente designadas por Meseta Central Ibérica que
outrora se estendia também por toda a metade norte da península, aí se
confrontaram os dois colossos insulares, mas o seu poder era equivalente sendo
a menor envergadura de Finn compensada pela sua maior astucia, talvez por isso
se diz agora de alguém astuto que é “fino”.
O combate durou uma eternidade e foi de uma brutalidade
extrema. De cada vez que um dos gigantes era lançado ao terreno surgiam montes
e vales logo inundados por torrentes de água que em tempestades jorravam dos
céus tumultuosos pela fúria que emanava daqueles gigantes. Poderá ser apenas
mais uma lenda mas a verdade é que a história de D. Quixote, que perseguia
gigantes imaginários por terras da Mancha, poderia estar relacionada com esta
luta ou de alguma memória que guardasse o seu rastro, ainda que um pouco
deslocalizado.
Quanto aos combates, Finn aproveitava o bastão de que se
fazia sempre acompanhar para, com alguns golpes de destreza, conseguir atirar o
gigante escocês ao solo. E assim o fez na primeira batalha, logo que Ben se
preparava para entrar na Ibéria. A luta prosseguiu algum tempo por ali, com
ambos os guerreiros a atingir o solo com tal violência que ainda hoje por ali
se encontram algumas das montanhas mais altas da península - os Pirinéus – num
desses golpes Finn para derrubar o seu adversário espetou o seu bastão no solo
com tal força que as águas que naquela zona deveriam escorrer naturalmente para
o Mediterrâneo (a sul da península), ainda hoje caiem nesse buraco, feito pelo
seu cajado, e vão parar ao Atlântico (a norte da península).
À medida que a batalha progredia, Ben mais potente
facilmente se erguia e atirava com o adversário para ocidente, num desses
golpes a queda de Finn fez com que surgisse uma nova montanha, hoje conhecida
como Urbião/Urbión, onde Finn quase perdia os sentidos ficando com a cabeça
encostada ao pico da montanha, Ben preparava-se então para lhe desferir o golpe
fatal quando aquele se desvia no ultimo instante.
A força com que o punho de Ben atinge a montanha, onde já
não estava a cabeça de Finn, é tal que parte do pico da montanha desaparece, deixando
no seu lugar umas paredes enormes que recortam a montanha desde o seu cume até
à Lagoa Negra, que fica uns 500m mais abaixo. No mesmo instante e do outro lado
da montanha, mas ali mesmo perto do pico e a mais de 2000m de altitude, com a
força do golpe, brota da terra, com toda a força, aquele que ainda hoje é o rio
mais forte da Ibéria (por ser o rio com maior caudal de água), o Rio Douro.
Mas não se pense que a batalha ficaria por aqui, durante
7 dias e 7 noites, continuaram a empurrar-se mutuamente, para ocidente primeiro
(assim surgem os Picos da Europa e cordilheira cantábrica, bem como as
montanhas galegas) e depois para sul (norte de Portugal).
Com golpes violentos que os desfiguravam e enfraqueciam,
as montanhas que daí provinham iam reduzindo de dimensão, no entanto, as quedas
eram cada vez mais frequentes e daí o terreno ter ficado tão agreste e sinuoso,
assim surgiram, por exemplo, montanhas como as do nosso Parque Nacional, a
Peneda-Gerês.
Ben continuava a tentar golpear Finn que se esquivava e
no lugar onde os punhos de Ben fissuravam a terra apareciam as chamadas fontes
benditas, pois dizia-se por aqui outrora que “Ben dita onde nascem os rios” e
por isso à nascente dum rio chamavam Fonte Ben-dita.
Por fim, aqui nestas terras, já perto do grande mar, e no
limite do cansaço, os dois gigantes tentavam desesperadamente um golpe final
que lhes desse a vitória no confronto. Agarrando-se um ao outro, praticamente
já só lhes restava discernimento para desferirem golpes mútuos com a cabeça no
intuito de quebrar o crânio do adversário e assim lograr vencer a contenda, no
entanto as forças eram cada vez mais escassas e as suas investidas apenas
resultavam em algumas fissuras superficiais naqueles couraçados.
E foi assim que, aqui mesmo neste local, já sem qualquer
energia vital, os dois colossos caíram por terra com as suas testas próximas e
com um fitar de morte que os petrificaria para sempre! Com os pés dentro do mar
e membros a empurrar as águas do Douro para sul, as suas cabeças ficaram para
todo o sempre aqui sepultadas, sob o pó da memória que pelos milénios aqui se
depositou para embelezar com um manto verde o local de tão horrenda contenda. Os
nossos antepassados que por aqui assistiram a tão catastróficos acontecimentos,
contaram às gerações seguintes que a batalha havia sido terrível e que nunca
houveram visto algo tão mau! Este lugar ficou para sempre conhecido pelos mais
sábios que contavam às novas gerações toda a história e lhes aconselhavam a não
mais se esquecerem que, o que outrora acontecera nas nossas terras, fora Muito Mauzinho!
Mas com o tempo também a memória destes
acontecimentos se iria perder, embora não totalmente, pois que neste local, em
que pisamos estas enormes massas de granito como se de uma calçada se tratasse,
afloram novamente os crânios petrificados e rachados dos gigantes que aqui
repousam depois da sua batalha final.
Talvez por
isso, também, este local seja conhecido por Monte Mózinho e que por aqui perto
nasça o Rio Mau!
© calcorreando 2016
terça-feira, 22 de março de 2016
A LENDA DOS OLHOS DE ÁGUA
A Lenda dos Olhos de Água...
(Texto Original / Ilustrações da Internet)
Houve um tempo em que a menina Vera vivia feliz brincando com os
seus primos Abraão e António (a quem chamavam Brão e Tono). No seu universo
havia sempre sol e alegria e a Vera cresceu feliz e divertida. No entanto um
dia, a sua ama Gaia casou com Bereno (ou Berno, como gostava que o tratassem),
mas Berno era um ser frio e tenebroso que impunha a sua vontade e disciplina a
todos, e a liberdade com que cada uma das crianças brincava com Gaia acabou! Gaia passava cada vez menos tempo com as crianças e, por ali, já só se ouvia falar de Gaia e
Berno!
As crianças começaram a passar cada vez mais tempo juntas e mais
ausentes de Gaia... O carácter de Tono e Brão era muito diferente um do outro,
mas ambos gostavam muito da sua prima Vera... o Tono de carácter moderado, como
a sua prima, sentia por ela muita afinidade e passava muito tempo junto dela
aleando-se um pouco do seu primo Brão. Já o Brão de carácter mais vincado, caloroso
mas temperamental, tinha ciúmes do Tono e queria brincar com a prima, mas sem o
Tono, pois como havia muita cumplicidade entre ambos, sentia-se excluído.
Por causa disto fazia de tudo para os separar e um dia em que Vera
procurava, como sempre, o Tono para novas brincadeiras, o Brão decidiu
afastá-la dele e enganou-a dizendo-lhe que o Tono havia conhecido uma nova
amiga, a Imprudência, e que os vira partir em direcção ao Desconhecido, um
lugar que ninguém sabia como lá chegar! Disse também que ainda tentara
que eles ficassem a brincar com ele mas que o Tono lhe tinha dito que já não
voltava a brincar com eles pois agora só gostava da sua nova amiga e iria com
ela para a sua terra, pois a Imprudência morava no lugar Desconhecido.
Vera ficou inconsolável e desatou num pranto tamanho que logo ali
nasceu uma lagoa de lagrimas daqueles olhos de água...
Não contente com este cenário o Brão, assim que viu o Tono
aproximar-se, e antes que a prima o avistasse, correu a chamar por Berno e
disse-lhe que o Tono havia sido horrível com a prima Vera, que lhe tinha tirado
as folhas, secado as flores e afoguentado os passarinhos que a divertiam, e ainda,
que insatisfeito por ele ter tentado ajudar a prima, lhe tinha tirado, a ele,
os frutos e roubado as colheitas, o Berno assim que ouviu esta história soltou
toda a sua fúria, saltaram relâmpagos da sua voz e tempestades dos seus braços,
vociferou ameaças de destruição ao Tono...
O Tono assim que ouviu tamanha fúria ao longe, olhou na sua
direcção e sentiu toda a ira do universo em Berno! Não percebera o que se
passava até que Bento, seu pai, lhe disse para fugir pois ouvira Berno prometer
destruí-lo se o apanhasse. Tono pôs-se em fuga e só voltou a aproximar-se de Gaia
quando o Bento lhe sussurrou que Berno já estava longe!
Desde esse tempo que a prima
Vera caminha pelo terrenos de Gaia à procura do Tono, espalhando os seus olhos
de água por onde passa ao mesmo tempo que todos alegra com o seu canto de ave e
o seu sorriso florido. O Brão, que continua a segui-la procurando alegrá-la com
as suas quentes e festivas noites e sua luxuriosa claridade, vai afastando-a
dali sempre que sente o Tono a chegar! Por sua vez o Tono quando chega, já não
vê sinais da prima Vera, acende fogueiras para a encontrar e constrói abrigos
para se esconder de Berno, recria as fontes que lhe recordam a sua amiga mas
logo se afasta assim que o Bento, seu pai, lhe sussurre que o Berno se aproxima
com vontade de o apanhar e aniquilar.
Berno na sua austeridade impôs que Gaia não tenha descanso, pois
tem de brincar com Brão ou Tono e também com a sua prima Vera, sem os conseguir
juntar. Por outro lado, Berno só se afasta de Gaia quando parte na sua caça ao
Tono. Por fim, Gaia ignorando que em
Berno existe uma aversão desmesurada ao Tono, adormece cansada nos braços do
marido assim que ele regressa da sua frustrada perseguição, despertando do seu
sono para brincar com todos novamente.
Por isso se dizia noutros tempos que:
da
exuberância rival de Brão ao Tono, só depois da ira em Berno é que a prima Vera
volta a Gaia!
ou como se diz agora:
da
fartura de Verão-Outono, só depois de ir o Inverno é que a Primavera volta à
Terra!
© calcorreando 2016
segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016
A LENDA DA FIGUEIRA
A Lenda
da Figueira...
(Texto Original / Ilustrações da Internet)
Conta uma lenda que por aqui vivia um
Velho Sábio de quem não se sabe nome nem idade e que este velho cuidava de duas
meninas, suas filhas adoptivas, pois que misteriosamente, num dia de tempestade,
à sua porta apareceram.
As duas irmãs, embora muito diferentes
eram muito bonitinhas, uma simples e carinhosa a outra mais rebelde e
caprichosa. Sempre que podiam as meninas gostavam de subir o monte e brincar,
trepando rochas e árvores, cantando e rindo, eram alegria nos olhos dos
pastores e camponesas que as viam passar.
O local preferido para brincar, no alto do
Monte Mózinho, era num penedio a que chamavam, pela sua forma, do Castelo. No
meio desses penedos havia uma Figueira muito velha, de tão velha que o seu
tronco enorme, já meio oco, conseguiria abrigar um urso, se ursos por lá
houvera!
Numa tarde de Inverno em que o sol aquecia
o Mózinho, uma menina, num penedo sentada, entoava uma canção de sossegar para
a irmã que, mais traquina, se empoleirava numa árvore ali ao lado. Não sabiam
porém aquelas meninas que aquela velha Figueira, de tão velha que era, era
mágica e escondia um segredo que, para elas, seria terrível, pois a Figueira
tinha sido ali colocada para aprisionar uma serpente, uma serpente medonha
daquelas enormes como não há memoria de ter voltado a existir, daquelas que
engoliam uma pessoa inteira de um só golpe e que outrora espalhara morte e
destruição pela terra. Nesse outrora, a aldeia só respirou de alívio quando
apareceu por lá um mágico muito poderoso, de tão poderoso que era, que conseguira
aprisionar a gigante serpente, fazendo-lhe crescer uma figueira, assim como que
por magia e em poucos minutos, saindo pela cauda do bicho, crescendo e criando
raízes que enraizaram a serpente, ao rochedo, para sempre.
Como histórias passadas algum dia caem em
esquecimento, também já por esta altura, pela aldeia ninguém se lembrava da
história, mesmo porque já há muito que as cobras gigantes haviam desaparecido
da face da terra e ninguém se lembrava do seu perigo, embora se falasse de que
por vezes desaparecia algum pastor sem deixar rastro. Apenas o velho sábio ainda
conhecia o segredo e por isso proibira as suas filhas de se acercar ao Penedo
do Castelo e à velha Figueira… no entanto todos sabemos como são as crianças, mais
dia, menos dia, uma mais atrevida ou a outra mais esquecida, lá fazem aquilo
que lhes disseram para não fazer.
Nessa tarde enquanto a menina cantava, a
serpente no seu covil assobiava, música que a menina não sabia de onde vinha
mas que a atraía cada vez para junto da Figueira. De tão próxima chegar, acabou
por ficar ao alcance do bicho que agarrou a petiz e a aprisionou envolvendo o
seu corpo e asfixiando-a lentamente... a outra menina que brincava em cima da
árvore avistou a cena e correu pra lá mas ao chegar perto viu que nada podia
fazer, pelo tamanho do bicho, e decidiu ir chamar o pai!
A menina correu monte abaixo como se a
própria serpente a perseguisse.
A outra, enquanto a ajuda não chegava,
cantava, pois apercebeu-se que sempre que cantava a serpente folgava na força que
fazia, o que lhe permitia respirar ao mesmo tempo que a confortava no seu
receio de que o pai não chegasse a tempo de a ajudar.
Assim que soube, o velho sábio correu
monte acima, como se as pernas de velho fossem de menino, sempre com a
esperança de chegar a tempo de evitar uma tragédia. Ele tinha a noção que não
poderia usar a força para retirar a filha daquele apuro, por isso teria de
fazer o que melhor sabia fazer, usar a sua magia.
Assim que ao alto chegou, logo à serpente
com palavras se atirou, ameaçando-a com a ira da aldeia, dizendo-lhe que se não
parasse imediatamente de sufocar a criança iria convocar todos os aldeões e
juntos lhe atiçariam o fogo. Depois propôs-lhe um trato – prometeu-lhe fazer
uma Poção de Figueira (sem usar os frutos e outras partes daquela Figueira que
eram venenosos para aquela serpente, impedida pela magia que a aprisionava de
comer os frutos do seu próprio ser venenoso), uma Poção feita com toda a essência
da Figueira, o que a deixaria livre daquela prisão para sempre! No entanto a
Serpente teria de prometer que deixaria as suas filhas em paz, também para sempre.
A serpente não sabia se aquilo era
verdade, mas só de imaginar q poderia deixar aquela árvore para sempre e descer
à aldeia pra se banquetear com todos os aldeões – sim, ela não tinha de
prometer não comer ninguém, só as filhas, e mesmo essas, depois decidia – só de
pensar nisso já lhe crescia água na boca e disse logo que sim, mas que caso o
velho não cumprisse com a palavra iria comer aquela e apanhar a irmã. O Sábio
anuiu mas pediu alguma paciência, pois a Poção necessitava de um pouco de cada
figueira da aldeia e, como tal, seria demorada.
O velho e a filha desapareceram então
durante todo o dia e toda a noite. A outra menina, já liberta daquele sufoco,
ainda que prisioneira, dormia, enquanto a serpente se mantilha de pestana
aberta, bem vigilante, para não ser enganada.
No dia seguinte, bem cedo, apareceu o velho sábio e a
filha com um caldeirão cheio de Poção com umas coisas negras a boiar mas que a
serpente não distinguira bem o que seria pois estava cheia de sono de ter
passado a noite acordada. Cheirou aquilo e sentiu logo o aroma da Figueira. Mas
havia um problema, a cobra não conseguia beber! foi aí que o velho lhe explicou
que aquelas coisas negras, que via a boiar, eram ratazanas enormes do tamanho
de lebres que deveria comer para assim ingerir a Poção. Também a convenceu de
que se as engolisse rapidamente, as ratazanas até lhe iriam saber a carne
humana. É claro que não deveria ser bem assim, isto do sabor, mas com o sono e vontade
que o bicho estava de comer gente, tudo lhe pareceria perfeito naquele momento.
O bicho estava faminto e desejoso de liberdade por
isso apressou o velho a dar-lhe as ratazanas. A cobra ia comendo ao mesmo tempo
que sentia a sua cauda a libertar-se lentamente da raiz. O velho ia-lhe dando
mais e mais, mas quando ia a meio ameaçou parar se ela não libertasse a filha
definitivamente. A cobra percebendo que era verdade e que poderia mesmo
libertar-se da figueira, soltou a menina e o velho deu-lhe o resto das
ratazanas ensopadas em Poção, esvaziando assim o caldeirão.
A cobra, assim que se viu livre daquela prisão,
aproximou-se do velho e disse-lhe: “agora que estou livre, e cumpri a promessa
de libertar a miúda, vou-te comer a ti e tornar me eu a serpente mais poderosa
e sábia à face da terra”.
Mas assim que se preparava pra engolir o velho sábio
de uma só dentada, sentiu que algo a pressionava por todo o seu corpo,
lentamente a cobra ia ficando cada vez mais pequena até que parou de encolher.
O velho pegou-lhe então pela cabeça, olhou-a nos olhos
e disse-lhe: “tu não sabias, mas o Poder e a Sabedoria são duas águas que não
se misturam, já que, o Poder que conquista a Sabedoria e fica sábio, perde o
poder… e a Sabedoria que alcança o Poder e se torna poderosa, olvida o saber! A
poção que te dei era a sabedoria que te libertou da Figueira para sempre, mas que
também te tirou a capacidade – o poder – de comer os homens. Por isso, de hoje
em diante, tu e os teus filhos terão de se alimentar dos ratos que dizimam as
culturas dos homens e nunca ireis crescer mais do que um ramo de Figueira pois
eu e as minhas filhas caçar-vos-emos”.
Conta-se que depois desta história nunca mais se viu
nem ouviu falar, por aqui, do velho e das duas meninas e que pouco tempo depois
apareceram nos céus uns pássaros gigantes a que os aldeões chamaram de águias!…
e há mesmo por aí quem garanta já ter visto essas águias a caçar cobras por estes
campos!
E foi assim que as cobras desta terra
deixaram de ser uma ameaça para os aldeões para passarem a ser uma ajuda contra
as ratazanas que, agora, não passam de ratinhos do campo e como diz o povo que
é sabido:
enquanto a Águia
pairar por Figueira
não haverá Cobra
para assustar a Mondadeira,
nem Rato para
esvaziar a Eira.
© calcorreando 2016
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